Mais de 50 jornais de 44 países, inclusive do Brasil, publicaram ontem um editorial conjunto acerca da Conferência das Partes do Clima (COP15) em Copenhague. O editorial, proposto pelo jornal inglês The Guardian, curiosamente consta apenas do Miami Herald e sua versão em espanhol nos Estados Unidos, não aparecendo nas páginas de OP-ED (opinião) de nenhum dos principais diários do país como New York Times, Washington Post ou USA Today. No Reino Unido, tão-somente o Irish Times reproduz o editorial do Guardian. Igualmente os principais jornais de Rio e São Paulo, no Brasil, não se juntaram ao protesto coordenado. O manifesto, em alguns momentos APOCALÍPTICO, em outros panfletário, ignora fatos, sonega outros e distorce importantes pontos do debate do clima. Vários pontos merecem comentários:
"Agora, os fatos começaram a falar por si: 11 dos últimos 14 anos foram os mais quentes já registrados, o gelo do Ártico está derretendo e a alta nos preços do petróleo e dos alimentos no ano passado é um exemplo do caos que pode estar por vir".
É uma falácia que os últimos 11 anos foram os 14 mais quentes já registrados. Trata-se de um absurdo científico, considerando que o planeta já experimentou no passado fases de temperatura incrivelmente mais elevadas. Os níveis de CO2 nos últimos 50 anos aumentaram 50 ppm (partes por milhão) na última metade de século, alcançando hoje ao redor de 388 ppm, mas o planeta já passou por épocas em que os níveis de CO2 chegaram a 5 mil ppm. Nos Estados Unidos, que possuem uma base de dados mais completa e atualizada que a brasileira, os anos mais quentes do último século ocorreram na década de 30. Os recordes de calor do Rio Grande do Sul de 1917 e 1943 seguem até hoje intocados.
O Ártico, realmente, perdeu massa de gelo nos últimos anos, apesar do degelo em 2009 e 2008 ter sido menor do que em 2007. Da mesma forma que o Ártico, também entre as décadas de 20 e 30, experimentou um período de perda de massa de gelo. Recentemente, o Met Office, serviço meteorológico da Grã-Bretanha, ferrenho defensor da influência humana no clima, atestou em comunidade que "a alta variabilidade (da cobertura de gelo no Ártico) torna muito difícil de atribuir a redução na cobertura de gelo às emissões de gases do efeito estufa pelo homem. O editorial sonega do público que a Antártida teve em 2007 um recorde na sua cobertura de gelo desde que iniciadas as medições por satélite em 1979. Há poucos dias, na Folha de São Paulo, o enviado especial à base brasileira Comandante Ferraz na Antártida noticiava o espanto dos cientistas do Brasil na região com o que vem ocorrendo. Segundo eles, os invernos rigorosos ocorriam em média a cada quatro anos e agora 2007 e 2009 tiveram invernos muito mais frios que a média na região. A base segue coberta de neve no mês de dezembro, quando não deveria haver mais, o que levou o correspondente da Folha a afirmar que "ao menos nesta parte da Antártida a melhor expressão é resfriamento global".
Atribuir à alta do preço do petróleo às mudanças no clima é uma ignorância econômica primária. Demanda, especulação financeira e depreciação do dólar foram os fatores que levaram à alta do petróleo nos últimos anos. O mesmo em relação a outras commodities como os produtos agrícolas que viram seus preços ir às alturas com a queda do dólar no mercado internacional e a maior demanda de países em desenvolvimento. No caso dos alimentos, há outro agravante que está sim relacionado ao aquecimento global, mas pela via transversa. A fim de reduzir as emissões de gases do efeito estufa, grãos passaram a ser usados na produção de biocombustíveis, o que é apontado por especialistas como uma das razões para o aumento nos preços em todo o mundo. Esses mesmos analistas alertaram que o uso de grãos (soja, milho, etc) na produção de biocombustíveis estava fazendo com que áreas de florestas em regiões tropicais, da Malásia ao Brasil, estivessem sendo desmatadas para abrir espaço para plantações. Ou seja, o remédio se transformou na doença. Curiosamente, os mesmos jornais que ontem no Brasil publicam esta editorial comemoraram no passado também em editoriais os biocombustíveis devido aos benefícios econômicos para a agricultura local.
Também no editorial:
"As mudanças climáticas foram causadas ao longo de séculos e têm consequências que durarão para sempre. As nossas chances de frear o problema serão determinadas nos próximos 14 dias".
Atestar que mudanças climáticas são irreversíveis denota outra ignorância científica. O planeta sempre alternou períodos quentes e frios que não duraram para sempre. Ao denominado Período de Aquecimento Medieval (MWP) seguiu-se a Pequena Era do Gelo (LIA) entre os anos 1500 e 1900 dC. O aquecimento medieval, contudo, não consta do chamado gráfico Hockey Stick de Michael Mann, citado no escândalo Climategate, apesar de estar presente na maioria dos trabalhos sérios de reconstrução climática na paleoclimatologia. A única constante na Natureza é a mudança e em determinado momento do futuro a Terra voltará a sofrer com glaciação.
No editorial:
"A ciência envolvida é complexa, mas os fatos são claros. O mundo precisa agir para limitar a 2ºC o aumento da temperatura global, um objetivo que exigirá que as emissões mundiais de gases-estufa alcancem um teto e comecem a cair nos próximos cinco a 10 anos. Um aquecimento maior, de 3ºC a 4ºC - o menor aumento que podemos esperar se continuarmos sem fazer nada -, poderá levar seca aos continentes, transformando áreas agrícolas em desertos".
O editorial afirma que o menor aumento que pode ser esperado (3ºC a 4ºC) não tem sustentação científica. O relatório do IPCC de 2007 diz que no melhor cenário (B1) o aquecimento seria de 1,8ºC (variação entre 1,1ºC e 2,9ºC). Logo, o mínimo sustentado pelos cientistas da ONU não é 3ºC, mas 1,1ºC.
Ainda no editorial:
"Muitos de nós, particularmente no mundo desenvolvido, terão de mudar seus estilos de vida. A era de voos que custam menos do que a corrida de táxi até o aeroporto está chegando ao fim. Teremos que comprar, comer e viajar de forma mais inteligente. Teremos de pagar mais pela nossa energia e usá-la menos".
Perguntas: Como os repórteres dos jornais que foram a Copenhague viajaram ? Não foram de avião ? Seus patrões não buscaram as passagens mais baratas ? Quantos dos donos destes jornais deixaram de andar de carro ou mudaram seus estilos de vida até hoje ? Se o custo da luz for aumentado para combater o aquecimento global, muitos destes jornais que publicaram o editorial serão os primeiros a protestar contra a energia mais cara para a população. A propósito, a imprensa dá conta que em Copenhague é tão grande a demanda por limusines entre os presentes na Conferência que houve a necessidade de buscar duas centenas destes veículos em outros países da Europa.
Autor do texto: Eugenio Hackbart (Chefe-Meteorologista da MetSul Meteorologia)
Pequena área de instabilidade se formou à oeste de Montenegro. Chance de pancadas de chuva nas próximas horas/minutos.
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